9 de março de 2006

Fernanda Leitão. É a Carta do Canadá

Como sempre, transmite-se a VEXA a Carta do Canadá, de Fernanda Leitão. Diz a verdade. Que dói.

Arquive-se.


CARTA DO CANADÁ
Fernanda Leitão

DE CARAS E CABEÇA LEVANTADA

A LUSA, agência noticiosa estadual, paga pelos contribuintes, fez há dias um despacho que começava nestes termos: “O Congresso Nacional Luso-Canadiano (PCNC) denunciou hoje “práticas discriminatórias” nas escolas canadianas em relação a filhos de portugueses, frequentemente classificados como portadores de “deficiências de aprendizagem”.

A acusação faz parte de um relatório cozinhado por várias pessoas, de que a LUSA destaca Ilda Januário, docente de língua francesa na Universidade de Toronto. Afirmando-se representante de 400 mil portugueses e luso-descentes, o relatório conclui que as crianças portuguesas são “rotuladas como portadoras de deficiência de aprendizagem” e com “menor grau de aptidões que a população em geral”, o que cria estigmas e provoca o abandono escolar. E acrescenta que “isto resulta de estereótipos, baixas expectativas escolares e avaliação incorrecta pelas instituições de ensino, baseadas nas dificuldades do domínio da língua inglesa e nas origens de classe social”. O documento termina exigindo “igualdade de oportunidades” e a “valorização da diversidade linguística”. Quanto à docente de língua francesa, adianta, segundo a notícia da LUSA, que “quando os filhos de pais portugueses vão para a escola sabem falar inglês, que aprenderam nas rua, mas têm dificuldades na escrita e na leitura” e são considerados como crianças com “deficiência de aprendizagem e colocadas em slas de ensino especial”.

Em resumo: o relatório aponta o dedo acusador ao governo do Canadá e aos pais portugueses. O que muito nos surpreende, porque o Congresso Luso-Canadiano vive dos dinheiros dados pelo governo canadiano desde a sua fundação, somando já umas largas centenas de milhar de dólares, e chama implicitamente iliteratos e ignorantes aos portugueses que diz representar. Confrange-nos esta assunção pública e mesquinha de cuspir no prato onde comeu e na falsidade de pisar as pessoas concretas que são os trabalhadores com filhos nas escolas por parte de um congresso que, certamente, deseja ser credível e respeitável, sobretudo depois de, nos primeiros mandatos, ter torrado os fartos subsídios governamentais em mesas redondas pelo Canadá fora , numa espécie de “presidência aberta” atamancada e inútil.

Claro que é verdade haver entre as centenas de milhar de emigrantes portugueses residentes no Canadá, um número não dispiciendo de analfabetos em estado puro e outros que correm ao chamado de analfabetos funcionais.

Analfabetos e letrados, nenhum deles veio fazer turismo para o Canadá, antes se rebentaram com trabalho por largas dezenas de anos. Se vieram para o Canadá sem saber ler nem escrever ou com poucas letras, ninguém com um pingo de decência os pode acusar ou utilizar: eles não são culpados de, desde há pelo menos século e meio, os regimes e os governos que se sucederam em Portugal nada terem feito pela educação do povo, de quem só esperaram que trabalhasse como um mouro, de preferência longe, pagasse impostos, comprasse casas e terras em Portugal, mandasse remessas de dinheiro abundantes e, naturalmente, que votasse em quem os deputados da emigração queriam contra promessas de uma condecoração, um consulado honorário, uma bolsa para um filho que, coitado, se estende ao comprido nas universidades portuguesas por não dominar a língua lusa, uma filha que quer começar uma carreira auspiciosa com um tacho numa embaixada, e o grande raio que partisse os vendilhões de banha da cobra que também por cá têm abandalhado o povo com estas promessas. Só uma falta se pode e deve apontar a este povo: em vez de se revoltar, emigra. Em vez de dar um murro na mesa, conta anedotas e bebe copos.

A gravidade deste relatório acusador do governo de um país que, de facto, oferece todas as oportunidades a todos os imigrantes, reside em factos muito concretos, a saber: há 10 (dez) anos atrás, um relatório que os jornais nacionais canadianos citaram abundantemente, afirmava que as crianças com pior aproveitamento escolar eram os filhos de portugueses e os de famílias negras.

Nessa altura, os autoproclamados dirigentes da comunidade portuguesa, atroaram os ares com berreiros revoltados, jeremiadas, ameaças afadistadas e outras acções de requintado gosto. Passados dez anos (10), nada melhorou, sendo caso para perguntarmos em que têm sido gastos os dinheiros dados pelo governo canadiano a congressos, federações, clubes, comissões, projectos e ajuntamentos de vária ordem. Ao mesmo tempo, estando a funcionar na Universidade de Toronto um Departamento de Espanhol-Português há 57 anos, nunca ali se formou nenhum professor de português, sendo de assinalar que os jovens universitários de raíz lusa gastaram dinheiro e tempo frequentando os cursos ministrados por esse departamento, ora por um leitor, ora por uma instrutora, sem que ficassem absolutamente preparados para enfrentar universidades e estágios em Portugal. É chegada a altura de se fazerem perguntas ao Instituto Camões e à Universidade de Toronto.

Não é acusando o governo canadiano, que não tem culpa de na comunidade existirem estes problemas, que se vai a lado algum. É de caras e de cabeça levantada que se pega este touro pelos cornos. Não é de cernelha nem ao estilo de toca e foge. É de frente que esta realidade tem de ser assumida, digerida e resolvida.

Não é com mesas redondas para mentes quadradas que se pode inverter a descida da Língua Portuguesa para o abismo.

Aqui são precisos professores competentes e cumpridores, integrados no ensino canadiano, que ganhem decentemente, que tenham turmas de tamanho razoável, que possam usufruir, ao menos de dois em dois anos, de reciclagem profissional.

Há que destacar diplomatas que, acompanhados de peritos em língua portuguesa e seu ensino, desde o básico, reunam com as autoridades do país de acolhimento para se chegar ao acordo necessário e urgente: professores competentes de Portugal, pagos pelas escolas canadianas. Porque, Portugal já não dispõe de dinheiro para tão grande empresa como é esta de manter viva a Língua Portuguesa nas comunidades de emigrantes, de dar às crianças e jovens descendentes de portugueses a oportunidade de serem bons estudantes de todas as matérias.

2 comentários:

Anónimo disse...

è muito triste ter conhecimento destas coisas... Nem parece do Canadá, que está entre os primeiros países no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH). Supostamente os canadianos já deveriam ter "evoluído" e ultrapassado preconceitos burros, e ideias discriminatórias.

Anónimo disse...

Carissimos

Esta "senhora" que tenho o prazer de nao conhecer devia ir para a escola ja! Ainda bem que so escreve em blogues.
Deve ser uma dessas aves raras armada em intelectual com a 4 classe de que o Canada esta cheio.
1-Estupidez e dizer que os "pobres" portugueses sao analfabetos por causa do Estado Novo ou da Democracia pos-25 Abril. Essa senhora e uma tacanha igual ao ex-delegado da Lusa (que ja tem, alias, outra digna sucessora vinda dos confins mais mediocres do jornalismo economico nacional, e deve ir ja para escola frequentar os cursos dos "tais" leitores e professores que invectiva de maneira peconhenta.
O Canada nao e nenhuma democracia no sentido europeu do termo (Europa=patria da democracia), e sim o supremo estadio do capitalismo americano com laivoa sovietizantes. Esta muito longe de ser um territorio livre onde se pratica a liberdade de expressao e...outras.
Os emigrantes portugueses eram e sao iletrados porque pertencem, e pertenciam, a extractos da populacao portuguesa com outras prioridades, tais como trabalhar para comer. Factos sao factos. E o facto e que, no Canada, encontraram alguma prosperidade economica, sendo a unica coisa que lhes interessa num Canada imenso, racista, que promove (de facto, sem rodeios nem escrupulos) a criacao de uma classe de cidadaos de segunda. de varias nacionalidades. Nao so portugueses.
O que acontece e que os filhos e netos dos portugueses estao agora na escola com mau aproveitamento naquilo que se chama globalizacao escolar.
Esperem pelas geracoes escolares de outras comunidades e terao surpresas ainda maiores.
Os portugueses sao discriminados e incutem esse sentimento de vergonha de "ser portugues" aos filhos.
A maioria das casas portuguesas nao tem um livro em casa. Nunca leem um jornal, a nao os pasquins nojentos editados por salsicheiros a que cham pomposamente jornais comunitarios (como as radios e as pseudo televisoes).
Cada pateta diz mal do outro nas costas. Todos convencidos e metidos a jornalistas, intelectuais e sabedores. Em vez de mandarem os filhos a escola e a universidade mandam-nos para so estaleiros da construcao civil, ou balcoes de lojas e restaurantes onde praticam um portugues mil vezes pior do que o dos pais (que e, o que sabemos) e um ingles de rua, broken, muitas vezes.
O que esperar da cultura de burros de carga?
A senhora so diz disparates e pensa que e uma grande analista. Tenha juizo.
Os |professores" de portugues das escolas inglesas, onde se ministra o portugues como lingua materna de apoio, sao quase sempre pessoas com a 3, 4 classe (nao brinco, a maioria veio de Angola a seguir a 75 e em vez de estarem no balcao da "venda' tornaram-se professores de portugues, ou tem a escolaridade obrigatoria em Portugal ha duas ou tres decadas. E um escandalo que passa incolume (comummente a governantes canadianos e portugueses).
Os chamados canadianos cultos nao passarima nas provas de admissao a universidade em quelquer comezinha universidade europeia.
A cultura, menos que mainstream, de chiclete nao e muito melhor do que a dos emigrantes. Mas tem uma "vantagem":a lingua materna e o ingles e promove o sistema suburbano da classe media baixa oriunda dos pioneiros anglo-saxonicos, leia-se classe dominante.
E so isto, senhora...
Desculpem estar sem pontuacao.
Melhores cumprimentos
31-03-2006